sexta-feira, 11 de março de 2011

O caipira no cinema: "Nhô Anastácio chegou de viagem" (1908)

O primeiro caipira do cinema foi o cantor de circo José Gonçalves Leonardo, que fez o Nhô Anastácio do título da película de 1908, dirigida e produzida por Marc e Júlio Ferrez. Nos quinze minutos de duração do filme, desfilam os quadros: A partida; Embarque na estação; Chegada à Estação da Estrada de Ferro Central do Brasil; Visita à caixa de conversão; O palácio Monroe; O passeio público; O namoro e a carta da cantora; A denúncia; Volta súbita da esposa; Perseguição e Conciliação Geral. A primeira apresentação dessa comédia pioneira foi no Cine Pathé, em 1908, no Rio de Janeiro. Mas em 1909 foi apresentada no Cinematógrafo Rio Branco (foto) com o ator principal dublando suas imagens por detrás do pano. Estudiosos consideram esta a primeira fita de ficção, ou seja, que apresenta um enredo.
Sérgio Augusto aponta, em seu livro Este mundo é um pandeiro: a chanchada de Getúlio a JK (Companhia das Letras, São Paulo, 1993): "Nhô Anastácio foi um precursor dos tipos celebrizados por Genésio Arruda, na virada do mudo para o sonoro, e por Mazzaropi, na virada de 50. Em seu tour pelos principais pontos turísticos do Rio, o primeiro jeca a fazer graça nas telas nacionais conhecia uma cantora e com ela flertava até o momento em que sua mulher chegava da roça para impor o único final feliz admitido pela moral e pelos bons costumes então vigentes." O autor considera-a uma precursora do gênero chanchada, que encontraria sua referência máxima no carnaval e não no caipira, ainda na primeira década do século 20. O pesquisador José Ramos Tinhorão, em Música popular: Teatro & Cinema (Vozes, Rio de Janeiro, 1972), defende que o tema da fita  foi tirado do grande contingente que chegava do interior ao Rio de Janeiro em 1908 para visitar a Exposição do I Centenário da Abertura dos Portos. "Tanto isso é verdade que o segundo filme documentadamente cantante, Sô Lotero e Siá Ofrásia com seus produtos na esposição, seria filmado (...) no próprio ambiente da Esposição do Centenário, ainda em 1908, o que demonstra a intenção de um aproveitamento máximo da cor local."
O principal é que a fita se baseia na estrutura do teatro cômico (em especial a revista), como aponta o pesquisador de cinema Rudolf Piper (Filmusical brasileiro e chanchada. Global, São Paulo, 1977): o trapalhão, o turismo, o namoro, a música, a confusão e o final feliz.

Um comentário:

João Carlos Rodrigues disse...

O enredo deste filme é quase um plágio da peça do Artur Azevedo, "A capital federal", que é de 1897. Lá tb tem caipira do Rio, cantora devorador de homens e o retorno ao interior.