quarta-feira, 13 de julho de 2011

O humor contemporâneo e grotesco de Piolin

O tema da minha pesquisa de pós-doutorado, as peças encenadas no Circo Piolin entre 1933 e 1961, período em que a lona esteve montada e preenchida pelo público, ávido pelas palhaçadas de Abelardo Pinto em seu período pós-Paissandu (quando este é considerado por muitos como o seu auge, quando atuou ao lado do clown Alcebíades Pereira e quando foi consagrado pelos intelectuais modernidtas, na década de 1920), foi esboçado num projeto apresentado à Fapesp em 2009, que o aprovou. A partir daí desenvolvo a pesquisa ao mesmo tempo que conduzo (junto com a Verônica Tamaoki) o projeto Entre risos e lágrimas - O teatro no circo (da pantomima aos dramas), uma parceria entre o Núcleo de Pesquisa em Comunicação e Censura (NPCC) - Arquivo Miroel Silveira da ECA/USP com o Centro de Memória do Circo, da Secretaria Municipal de Cultura. Na verdade uma coisa faz parte de outra. Ou seja, a medida que avanço em minha pesquisa, o universo da palhaçaria se desvela a partir do projeto (saiba mais na aba circo-teatro). Bom, o projeto de pesquisa foi transformado em artigo que, recentemente foi publicado pela revista acadêmica Repertório Teatro & Dança, editada pelo Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade Federal da Bahia. Aliás, o número 13 da publicação é dedicado integralmente às artes circenses. Além do meu artigo, chamado As farsas de Piolin: entre o grotesco e a contemporaneidade, a edição publica artigos de Daniela Pimenta, Ermínia Silva e Mário Bolognesi, pesquisadores dedicados ao universo circense que já publicaram em livro, além dos artigos de Marcos Francisco Nery Ferreira, Fabio Dal Gallo, Reginal do Carvalho, Paulo Merisio, Ana Lucia Marques Camargo Ferraz, além de um ensaio sobre a peça de circo-teatro Chico e o diabo, do palhaço negro Benjamim de Oliveira, de Eliene Benício Amâncio Costa. Acesse a edição eletrônica da revista Repertório, e, aqui leia um pequeno trecho do meu artigo:



“A contemporaneidade é uma das marcas da comédia de picadeiro. Seu humor é sempre contemporâneo, faz referência a fatos e temas atuais, usa jargões e gírias do momento. Apesar de fora do establishment, o excêntrico é atual, sabe que as suas referências serão conhecidas. Exemplo disso é a última peça encenada no Circo Piolin que aparece no Arquivo Miroel Silveira, de maio de 1958, assinada por Humberto Pelegrini: Piolin no planeta Marte. Em 1958, o tema das viagens espaciais estava em voga, especialmente por servir ao cinema americano para ilustrar a Guerra Fria. Filmes como O dia em que aterra parou (1951), O enigma de outro mundo (1951), A guerra dos mundos (1953), O mundo em perigo (1954), A invasão dos discos voadores (1956) e Planeta proibido (1956) deram sua contribuição ao imaginário popular da época.
Um ano antes da peça ser encenada, por exemplo, aUnião Soviética lançava a cadela Laika ao espaço depois do sucesso do satélite Sputnik. Na comédia, logo no início, uma dupla de cientistas busca um voluntário para enviar a Marte em troca de 500 mil cruzeiros, depois de ter enviado um macaco, uma cesta de gatos e duas dúzias de frangos. Fugindo da sogra, Piolin (ou Zé), bêbado, aceita seguir na viagem interplanetária. Ao chegar a Marte, é confundido com o rei do planeta pelo “lunático” (habitante da Lua) que vai desposar a fi lha do marciano; se aproveita da situação e acaba roubando-a no final. Mas é surpreendido pela sogra, que chega num outro foguete somente para desmascará-lo. A condição inicial do protagonista excêntrico é a estranheza, pois de início ele se coloca à mercê da cena, mas sempre cético em relação à situação. É por isso audacioso, pois não receia quebrar as regras, enfrentando o mundo a que julga não pertencer com ironia, humor e excentricidade. Sua resposta a qualquer situação estabelecida é sempre baseada no grotesco, comprometido que está em arrancar o riso da platéia. No caso da peça em que visita Marte, descrê da tecnologia e, assim, mantém um traço de Romantismo para resgatar uma ingenuidade atávica contra o “avassalador avanço técnico”. (...) É essa oscilação entre o contemporâneo (efêmero e atual, de onde extrai o humor) e o grotesco (condição do tipo excêntrico, que vive no limite entre o bom senso e o absurdo) que parece caracterizar Piolin em suas atuações. Algo que vai além de sua performance física e dos textos dramatúrgicos disponíveis para conhecimento e análise de sua obra encenada. Mas que pode ser analisado de forma científica a partir das Ciências da Comunicação.”

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