quinta-feira, 7 de abril de 2011

Circo e literatura: Jubiabá, de Jorge Amado (1935)

"Fora era lindo de luzes e de cores. A tabuleta do Circo - Grande Circo Internacional - brilhava em vermelho, azul e amarelo, as lâmpadas piscando. Negras de anágua e colares vendiam pipocas, acarajés, mingau, e munguzá. Todo o largo estava iluminado pela luz do Circo. Moleques rondavam os lugares por onde podiam entrar de carona. Um homem vendia caldo de cana e um negro sorveteiro só queria era acabar logo a vasilha de sorvete para poder entrar pro galinheiro também. E dava grandes risadas antegozando o palhaço que era mesmo brincalhão. O povo comprimia-se na bilheteria da geral, onde Luigi esfregava as mãos de contente. E as velhas da cidade estão espantadas com aquele movimento na terra pacata que dorme às nove horas. É que o Circo revolucionou tudo, o Circo é a novidade, é viagem, são as feras dos outros países, é a aventura. Negros inventam histórias sobre os artistas.
Eis que vem a música. Agora está dobrando a Rua Direita e já se ouve o som da marcha carnavalesca. No Circo todos se levantam. Os que estão nos bancos mais altos da geral espiam por cima do pano. Os moleques que estão na porta do Circo correm e acompanham a Euterpe 7 de Setembro que vem garbosa, marcial, vestida de verde e azul. Seu Rodrigo da farmácia é um bicho na flauta. O pistão atira sons que ficam vibrando no ar e vão se bater na cabeça de Antônio Balduíno que foge da barraca e vem olhar a música. Banda bonita. Estão bem vestidos como o diabo! Aquele que vai ali de costas é o maestro. Antônio Balduíno bem que trocava o seu lugar de lutador pelo homem magro que vai de costas dirigindo a Euterpe 7 de Setembro. Mas é bonito de verdade, pensa o negro. Como todas as mulatas olham para ele! Todo o povo. Ele é bem um herói da cidade, uma glória de Feira de Santana. Como o flautista também. São conhecidos de todos e cumprimentados por todos. O juiz tira o chapéu para eles e os rapazes do banco quando querem fazer uma farra convidam o flautista para ir com eles e pagam bebidas e o tratam de igual para igual contanto que ele leve a sua flauta. Mas Giuseppe arranca Antônio Balduíno da contemplação da banda de música. O negro vai para a barraca levando no coração a vontade de dirigir uma Euterpe. A 7 de Setembro vai entrando no largo do Circo. Vem cercada de gente, importante, cônscia do seu prestígio. Na porta do Grande Circo Internacional o maestro dá uma ordem e todos os músicos param. Na geral, nas cadeiras, nos camarotes, na barraca dos artistas, também, todos estão ouvindo o dobrado que a Euterpe executa na porta do Circo. E todos pensam que é divino e que Feira de Santana tem, sem dúvida, a melhor banda de música de todo o Estado. Acabado o dobrado entram no Circo e vão se instalar por sobre a porta num tablado que ali está, especialmente para eles. Agora, que a música já chegou os espectadores reclamam o início do espetáculo que está tardando.
- Palhaço! Que saia o palhaço!"

(As desventuras do negro Baldo - Antônio Balduíno - entre as lides populares de Salvador acabam se estendendo a Feira de Santana, onde entra para o Grande Circo Internacional como lutador. No trecho reproduzido, tem início a função, ponto alto antes do desfecho em que o circo se desfaz e os amigos Baldo e Luigi se viram com o espólio da companhia: um leão, um urso, e a mulata Rosenda).

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