Na tarde de autógrafos em que lancei meu livro Mixórdia no picadeiro, no Centro de Memória do Circo, no final do ano passado, estavam lá outros autores assinando seus projetos e pesquisas, entre eles o casal Gallo Cerello e Elena Cerântula, do Circo Vox. Em 2010 eles empreenderam o projeto Nostalgia, que envolveu um espetáculo e um livro, este com o subtítulo: "À História que viveram, à que vivemos e à que virá. Que o Circo persista!" A publicação reúne depoimentos de seis circenses: Elza Marlene Alves Dias (trapezista, aramista e domadora); Dora Sofia Rutiz (telepatia); Benedito Sbano (o palhaço Picoly, já conhecido dos leitores do blog); Ricieri Pastori, o Julius (acrobata e ginasta); Teresita Mendez Aurich (equilibrista e aramista); e Elza Wolf (corda marinha e trapezista). Enfim, um circo completo, do passado, todos remanescentes do período áureo do circo brasileiro, entre as décadas de 1940 e 1960. O trabalho da dupla de autores, mais do que o registro da memória, foi trazer para o presente o tempo do passado, cristalizado nas almas dos artistas e vertido em forma de depoimentos. Complemento do espetáculo dirigido pela dupla, ele tem autonomia por tocar a alma circense de um modo direto e, ao mesmo tempo, delicado. A versão digital do livro pode ser acessada aqui. O mais interessante é que o Vox tem uma relação com esses circenses como a do aprendiz com o mestre budista: buscam a "linhagem". Por sorte, a encontraram. A seguir, uma pequena prova disso.
"O circo é uma natureza, tá no sangue. Se a gente está parado, morre. É igual uma flor que vai murchando." (Elza Marlene)
"A gente sempre aplaude aquele que fala bobagem. Eu acredito que a alegria do circo é a melhor que tem. É um lugar muito lindo..." (Dora Sofia Rutiz)
"A gente tem sempre que aprender. Até hoje eu me coloco na frente do espelho e começo a fazer mímica, caretas, pra ver como é que o palhaço faz uma careta na hora da malandragem, ou da ingenuidade ou bobo." (Benedito Sbano)
"Nossa, a coisa que mais tenho saudade é a vida no circo. (...) É uma vida muito boa, precisa amar, precisa amar tudo o que se faz, tudo na vida precisa amar e gostar, mesmo que você ganhe pouco..." (Ricieri Pastori)
"Eu tenho muito orgulho, sou muito orgulhosa de ter sido de circo e de continuar fazendo minha arte hoje em dia, eu fico muito feliz quando alguém realmente leva a minha arte, a arte que eu ensino, sabe?" (Teresita Aurich)
"Mas sinto muita saudade mesmo, lembro que cinco horas da tarde corríamos pra se arrumar, se vestir, às seis horas já tocava a música, às sete horas já estava todo mundo pronto, era um momento muito lindo, o companheirismo que tinha entre os artistas, as brincadeiras, porque passava da cortina pra frente a gente era artista e mostrava sua arte, mas atrás das cortinas éramos tão companheiros, eram tantas brincadeiras..." (Elza Wolf)
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